ABRAÇO EM PROSTÍBULO — 19/02/2024
Já quis ser benquisto por meia dúzia de talentos medianos: cordas mais ou menos dedilhadas, causos nem tão engraçados, rimas de luz e Cruz, passes imprecisos e outros vernizes de mediocridade. Por afã de romance, traí-me ao abraçar o meretrício remunerado em afeto sem substância. Tornei-me barato; ou pior, precifiquei a alma.
Tal qual Fernando Pessoa, o paletó que vesti era errado e, por sofrer de “adolescentite”, não quis tirá-lo. Parecer para receber me soava mais atrativo; hasteei bandeira branca ao parasita. “Ora, de que vale conquista que não foi… conquistada?!”.
Tolo, ignorante e… vendido.
A desgraçada competência ilusiva me encontrara também aqui. Sem ser convidada, deu as caras, atou mãos ao diabo e sussurrou ao pé do meu ouvido que fazer por merecer é o segredo do amor romântico. Alto fardo me foi imposto: ser quem não sou para receber por aquilo que não é meu e nem eu. Impuseram-me mentira guela à fora e engoli seco. Amor isso não é; isso é outra coisa: desgraça — no sentido mais literal.
O amor não cobra centavos. O amor perde controle, espera e alivia fardo. O amor dá mais que recebe. Sempre. O amor põe fim ao mérito; não depende de vernizes, tampouco exige competências. Não se conquista; se recebe. Sempre assim — desde “haja Luz” até a Cruz.
“A graça de um amor gratuito”, disse-me o reverendo. Não demorei muito para dar-me convencido; percebo ser uma necessidade, de certo, ontológica. Na contramão da prostituição da própria personalidade, o amor gratuito reside sobre o sólido terreno agápico da fidelidade e aliança. Não há espaço para meritocracia. Não ali. Naquele terreno, o meretrício torna-se tão vão quanto abraço em prostíbulo.